Cacique Seattle: o indígena que idealizou uma sociedade pacífica entre brancos e nativos

Estátua em homenagem ao líder indígena, em Seattle / Crédito: Divulgação

O líder indígena foi uma das mais famosas figuras da história dos EUA

O cacique Seattle, ou Sealth, como muitas vezes é chamado, representou uma das lideranças mais importantes da história dos EUA.

Com 1,8 metro de altura, era considerado um homem belo e forte, além de ser um grande guerreiro indígena. Com o passar do tempo, o chefe das tribos Duwamish e Suquamish, tornou-se uma figura lendária.

Há ainda um famoso texto, muito difundido nos dias de hoje, cuja autoria costuma ser atribuída ao chefe: a carta do cacique Seattle ao presidente Franklin Pierce, que é tida como um manifesto em defesa da natureza. Contudo, sua autenticidade é controversa, uma vez que há diversas versões documento.

Alguns historiadores afirmam que há evidências de que a carta como conhecemos hoje em dia foi escrita muito depois de 1855, período em que dizem ter sido elaborada.

Outros consideram que o verdadeiro discurso tratava-se apenas de um agradecimento ao presidente, que teria comprado terras dos indígenas.

 

Franklin Pierce / Crédito: Wikimedia Commons

Independente da real versão do documento, não há dúvidas de que o líder existiu. Nascido por volta de 1790 no local onde hoje fica o estado de Washington, ele exerceu um papel de destaque na história do país.

Grande personalidade

De acordo com o historiador David Buerge, em texto publicado no site da Humanities Washington, o final do século 18 foi um período extremamente sombrio para as populações indígenas que viviam nos EUA.

Isso porque, ao menos 50% dos nativos perderam suas vidas devido a inúmeras doenças levadas pelos brancos ao território, em especial a varíola.

 

Cacique Seattle em 1860 - Wikimedia Commons
 

Por ter crescido em meio a tamanha mortandade, Seattle logo se tornou um grande guerreiro que defendia seu povo das invasões dos euro-americanos.

Contudo, por volta dos seus 50 anos de idade, o cacique começou a mudar de ideia em relação aos brancos. Foi nesse período que ele passou a idealizar uma sociedade birracial, na qual brancos e indígenas poderiam viver em paz.

 

Terras nativas

Conforme repercutido pelo History EUA, logo no início da década 1950, um grande número de colonos se mudou para o território dos nativos para criar uma nova cidade. Pelo fato do líder ter sido tão amigável com os brancos, estes decidiram nomear o novo assentamento em sua homenagem.

Com o tempo, o chefe indígena passou a adotar costumes dos colonos, tendo até mesmo se tornado cristão, de modo que praticou a nova religião até sua morte, em 1866.

 

Hoje a cidade de Seattle é a maior do estado de Washington / Crédito: Wikimedia Commons
 

Contudo, muitos nativos eram contrários a essa aproximação, de modo que, no ano de 1855, um grupo atacou a vila dos colonos.

Seattle logo os convenceu de que a violência não era a melhor saída, já que, dessa maneira, os brancos se irritariam e acabariam por extinguir a população nativa. 

De início, a sociedade birracial parecia ter futuro e houve casamentos entre brancos e nativos. Porém, segundo Buerge, não demorou muito para que os euro-americanos passassem a ver os nativos como "selvagens" e a levá-los para reservas distantes, de modo que o ideal de Seattle logo foi esquecido. Em contrapartida, seu nome é lembrado até os dias de hoje.

 

Uma das versões da famosa carta do Cacique Seattle para o presidente Americano:

 

"Tudo quanto fere a Terra, fere também os filhos da terra." (Cacique Seattle, 1885) 

Carta do Cacique Seattle, da tribo Duwamish, do Estado de Washington, para o Presidente Franklin Pierce, dos Estados Unidos, em 1855, depois de o governo ter dado a entender que pretendia comprar o território da tribo. "O grande chefe de Washington mandou dizer que deseja comprar a nossa terra. O grande chefe assegurou-nos também de sua amizade e sua benevolência. Isto é gentil de sua parte, pois sabemos que ele não necessita da nossa amizade. Porém, vamos pensar em tua oferta, pois sabemos que se não o fizermos, o homem branco virá com armas e tomará nossa terra. 

O grande chefe em Washington pode confiar no que o chefe Seattle diz, com a mesma certeza com que nossos irmãos brancos podem confiar na alternação das estações do ano. Minha palavra é como as estrelas - elas não empalidecem". Como podes comprar ou vender o céu, o calor da terra? Tal idéia é-nos estranha. Nós não somos donos da pureza do ar ou do resplendor da água. Como podes então comprá-los de nós?Decidimos apenas sobre o nosso tempo. Toda esta terra é sagrada para o meu povo. Cada folha reluzente, todas as praias arenosas, cada véu de neblina nas florestas escuras, cada clareira e todos os insetos a zumbir são sagrados nas tradições e na consciência do meu povo. Sabemos que o homem branco não compreende o nosso modo de viver. Para ele um torrão de terra é igual a outro. Porque ele é um estranho que vem de noite e rouba da terra tudo quanto necessita. A terra não é sua irmã, mas sim sua inimiga, e depois de exauri-la, ele vai embora. Deixa para trás o túmulo dos seus pais, sem remorsos de consciência. Rouba a terra dos seus filhos. Nada respeita. Esquece a sepultura dos antepassados e o direito dos filhos. 

Sua ganância empobrecerá a terra e vai deixar atrás de si os desertos. A vista de suas cidades é um tormento para os olhos do homem vermelho. Mas talvez isso seja assim por ser o homem vermelho um selvagem que nada compreende. Não se pode encontrar paz nas cidades do homem branco. Nem um lugar onde se possa ouvir o desabrochar da folhagem da primavera ou o tinir das asas de insetos. Talvez por ser um selvagem que nada entende, o barulho das cidades é para mim uma afronta contra os ouvidos. E que espécie de vida é aquela em que o homem não pode ouvir a voz do corvo noturno ou a conversa dos sapos no brejo, à noite? 

Um índio prefere o suave sussurro do vento sobre o espelho da água e o próprio cheiro do vento, purificado pela chuva do meio-dia e com aroma de pinho. O ar é precioso para o homem vermelho. Porque todos os seres vivos respiram o mesmo ar - animais, árvores, homens. Não parece que o homem branco se importe com o ar que respira. Como um moribundo ele é insensível ao seu cheiro. Se eu me decidir a aceitar, imporei uma condição. O homem branco deve tratar os animais como se fossem seus irmãos. Sou um selvagem e não compreendo que possa ser certo de outra forma. Vi milhares de bisões apodrecendo nas pradarias, abandonados pelo homem branco que os abatia a tiros disparados do trem. Sou um selvagem e não compreendo como o fumegante cavalo de ferro possa ser mais valioso do que um bisão que nós, os índios, matamos apenas para sustentar nossa própria vida. 

O que é o homem sem os animais? Se todos os animais acabassem, os homens morreriam de solidão espiritual porque tudo quanto acontece aos animais pode também afetar os homens. Tudo está relacionado entre si. Tudo que fere a terra fere também os filhos da terra. Os nossos filhos viram seus pais serem humilhados na derrota. Os nossos guerreiros sucumbem sob o peso da vergonha. E depois da derrota passam o tempo em ócio, e envenenam seu corpo com alimentos doces e bebidas ardentes. Não tem grande importância onde passaremos nossos últimos dias - eles não são muitos. Mais algumas horas, até mesmo uns invernos, e nenhum dos filhos das grandes tribos que viveram nesta terra ou que tem vagueado em pequenos bandos nos bosques, sobrará para chorar sobre os túmulos, um povo que um dia foi tão poderoso e cheio de confiança como o nosso. De uma coisa sabemos que o homem branco talvez venha um dia a descobrir: - O nosso Deus é o mesmo Deus! - Julgas, talvez, que o podes possuir da mesma maneira como desejas possuir a nossa terra. Mas não podes. Ele é Deus da humanidade inteira. E quer bem igualmente ao homem vermelho como ao branco. A terra é amada por Ele. E causar dano à terra é demonstrar desprezo pelo seu Criador. O homem branco também vai desaparecer talvez mais depressa do que as outras raças. Continua poluindo tua própria cama, e hás de morrer uma noite, sufocado nos teus próprios dejetos! Depois de abatido o último bisonte e domados todos os cavalos selvagens, quando as matas misteriosas federem à gente, e quando as colinas escarpadas se encherem de mulheres a tagarelar - onde ficarão então os sertões? Terão acabado. E as águias? Terão ido embora. Restará o adeus à andorinha da torre e à caça, o fim da vida e o começo da luta para sobreviver. 

Talvez compreenderíamos se conhecêssemos com que sonha o homem branco, se soubéssemos quais as esperanças que transmite a seus filhos nas longas noites de inverno, quais as visões do futuro que oferece às suas mentes para que possam formar os desejos para o dia de amanhã. Mas nós somos selvagens. Os sonhos do homem branco são ocultos para nós. E por serem ocultos, temos de escolher o nosso próprio caminho. Se consentirmos, é para garantir as reservas que nos prometeste. Lá talvez possamos viver os últimos dias conforme desejamos. 

Depois do último homem ter partido e a sua lembrança não passar de uma nuvem a pairar acima das pradarias, a alma do meu povo continuará a viver nestas florestas e praias, porque nós as amamos como um recém-nascido ama o bater do coração de sua mãe. Se te vendermos nossa terra, ama-a como nós a amávamos. Protege-a como nós a protegíamos. Nunca esqueças como era a terra quando dela tomaste posse. E com toda tua força, o teu poder, e todo o teu coração - conserva-a para teus filhos e ama a todos. Uma coisa sabemos: o nosso Deus é o mesmo Deus. Esta terra é querida por Ele. Nem mesmo o homem branco pode evitar o nosso destino comum." 

Por Giovanna Gomes

Fonte da Matéria: https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/reportagem/cacique-seattle-o-indigena-que-idealizou-uma-sociedade-pacifica-entre-brancos-e-nativos.phtml

Fonte da Carta: http://biblioteca.funai.gov.br/media/pdf/Folheto43/FO-CX-43-2698-2000.pdf

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